Deixei minhas iniciais
Gravadas nas pedras dos cais.
Isso foi há muito tempo,
Tempo em que meus pés eram pequenos,
Mas meu coração não tinha tamanho.
Sinto ainda o cheiro do enxofre nos trilhos
E a sensação de pertencer àquele lugar.
Era como amar sem saber quem estava comigo.
A maldade da maturidade ainda não me havia chegado.
Prostitutas eram rainhas pintadas
E seus gigolos, homens com roupas engraçadas.
Os bares mal frequentados,
Onde homens bem educados cuspiam no chão,
Um gole para o santo, outro para a traição.
Eu, menino matreiro, amava a filha do jornaleiro,
Ganhava as melhores figurinhas
Cujos álbuns nunca se completavam.
Eu vivia um bocado, entre a corda das âncoras
E os calados dos navios.
Um céu imenso tomava conta do meu coração,
Enquanto o monumento de aço dormia sobre as marés.
Maré, esse era meu apelido.
Hoje, ninguém me chama assim,
Meu passado se apagou dentro de mim.
Os grandes guindastes que rebocavam a Lua,
Permanecem imponentes,
Numa rua sem nome e sem fim.
Não tenho mais pernas para correr entre os silos,
Não ouço mais os sinos do Valongo,
E por mais longo que seja este poema,
Valeu a pena ter vivido.
 
MARIO SERGIO SOUZA ANDRADE
Enviado por MARIO SERGIO SOUZA ANDRADE em 10/04/2016
Código do texto: T5601126
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