Paisagem de palavras

O mês de março

desaba sobre os telhados,

sob os quais fluem

jatos-goteiras

, liquefazendo aquela imagem

--já difusa -- da paisagem

memorável:

uma estampa, um postal,

conjunto da estrada líquida

cobreada do Pratiquara

com suas margens

inundadas de mangueiros e siriúbas...

Um lápis mental

vai derrapando o grafite

em linhas de meio-tom

por este curso d’água

reconstruindo

uma bela paisagem de palavras

-- estas deste poemeto –,

onde a utopia traz

pelos olhos

que decodificam os signos

deste grande bem perdido

em degradas águas

turvas

a cortar, serpenteando,

um solo pobre

e desmatado.

A paisagem de letras

-- em imagem difusa,

não esqueçamos –

põe de volta no céu coloridas aves e,

no rio,

lépidos peixes.

Põe também a musa

nesta canoa

que piloto;

põe em nossas mãos

taças de vinho,

nos meus lábios

os doces beijos dela,

a ambrosia há muito desejada...

o céu azul em pleno

inverno amazônico,

põe, enfim

-- o poeta grafitando nesta página --,

Sim, põe

o caos

em grande

harmonia

(nesta bela paisagem de palavras).