Haverá um mar

Haverá um mar

onde a água escorra

e suspenda os barcos

ocultos pela neblina

espadanando a manhã

onde escorra caudas de cometas

poeira etérea

e astros esquecidos espelhem-se

atravessando

e fecundando as madrugadas ofegantes

e prisioneiras do instante Primordial

que proclamem poemas e ilações

E sobre o mar

cairão estrelas

enchendo de luzes e mistérios a noite

voarão tardios pássaros

em noites insidiosas

brancas asas

contrastando com o negro silêncio

marulhado pelas ondas

e pelas lágrimas que se alongam em meus olhos

ofuscadas pela vida que não entendo

E no mar

nadarão os peixes ressonantes

arrastando os momentos intermináveis e liquefeitos

desmanchando a existência líquida e absoluta das águas

Um dia há de vir do horizonte este mar

e esta mata

e o vento cantará as doces palavras

que pedirão em imolação

o beijo que aguarda nas bocas

entre salivas e balbucios de indecisão

E na terra abandonada pelo mar e pelo sal

a flor nascerá e crescerá e morrerá

sem sequer atentar para que horas são

nascerá e crescerá e morrerá

por que é o Devir dos Seres nascer, crescer, morrer

E nas paredes as sombras se erguerão do solo

e nas matas assomarão procriando montes

numa escuridão crucial e infrangível

escondendo dos meus olhos os ventos

e o canto das folhas secas

caindo na solidão amarelada

pelo pólen que cobre a terra

e que afaga os meus passos

principiando a morrer

No ar um aroma fito neste silêncio enorme

pintalgado de verdes perfumes e memórias

abraçada ao vento a solidão alardeia a ausência

o trêmulo orvalho pendula

na solitude da pétala de uma flor da montanha

atravessa a tua ausência em meus versos

que se alinham na madrugada dos pensamentos

na insônia gritando as horas covardemente

deixando no corpo este esfalfante cansaço

dos erros impudentes

e a lembrança ofegante

do roçar dos teus seios em mim

como a brisa lânguida

acarinhando com frescores

o beijo de um sol em meu corpo