Torrente
Às vezes a tristeza
Extravasa
A razão, o sentido
E se perde de seu motivo
Paira sobre o vazio
Profundo
De um suspiro
Há momentos em que a dor
Penetra fundo na pele
Atravessa a carne
Se dissemina no sangue
Apega-se aos ossos
E, mesmo assim
Se liberta do corpo
Para permanecer
Aonde nenhum remédio a alcança
E o luto repousa
Como beija-flor imóvel no ar
Num equilíbrio fino
De malabarista
Não há o que explicar
Palavras desaparecem
Levam junto a fome
E trazem uma enorme sede
Que água nenhuma sacia
Em rios caudalosos
Explodem as fontes das águas
Rompem-se em torrentes
As lágrimas
E o corpo é um não-lugar
O pensamento vagueia
No limbo do luto
E nada do mundo é real
Ou, pelo menos,
Não queremos
Que seja.