A Pedra
Era uma pedra no canto da sala
Que ocupava o desconfortável e velho sofá
E de vez em quando rolava pra fora
E ia à cozinha
Batia na pia, quebrava uma louça
Trazia problemas
Ninguém falava da pedra
Embora notassem-na grande e preta
A pedra ocupava espaço
Causava embaraço
A grande pedra preta e pesada.
Um dia a pedra, em seu canto oportuno
Pegou o controle remoto
E, de seu canto remoto
Mudou o canal da TV
E todos se indignaram ao ver a pedra
Grande, preta e pesada
Fazer algo mais que nada
A pedra pesada e parada
Vivia enrolada em si mesma
Como linha em carretel
A pedra preta e putre
Aumentada em gravidade
Sugava todo halo de luz
Era um pequeno buraco escuro
A grande pedra ensimesmada
O povo da casa falava
Vez ou outra, num canto escondido
Pois nao se fala de corda em casa de enforcado
"Precisamos mover essa pedra"
"Precisamos tirá-la daqui!"
porém era trabalho gigante
tirar qualquer coisa da pedra
Muito mais a pedra em si
A pedra seca de Meribá
A pedra teimosa de Refidim
A pedra de culpa
do Sinai
A grande pedra pesada e culpada
Não era um diamante bruto
Não havia nada dentro da pedra
A pesada pedra de olhos ocos
Olhava de volta e olhava sempre
Com a expressão de uma Monalisa morta
Em três dimensões a pedra pesada e culpada
Seca, oca, preta e enrolada
Olhava de volta
E em sólida porosidade
A pedra se liquefazia no canto velho e remoto
A pedra pulverizava todo o resto
E tornava o clima festivo funesto
A pedra preta e porosa
A pedra feia e asquerosa
Cheirava a cadáver
Lembrava uma lápide