SERENATA
Na madrugada cinzenta e fria,
uma voz maviosa se levanta.
São afagos para a moça esguia,
que dormita e se encanta.
Os sons da rua são convites
dolentes, como do lobo o uivar.
Os acordes da viola são tristes,
como o som das ondas do mar.
A voz se agiganta,
quase um queixume,
evocando a alma de crisol,
tranças da cor do negrume
maculado pelo próximo arrebol.
Foi nesse encantamento
supremo da adolescência
que Tereza pôs-se a sonhar
com o amor das aves
planando no firmamento
e o segredo das rãs a coaxar.
A voz se aproxima.
Melodia envolvente
possuindo corpo e alma
na subida apoteótica
acima do vôo dos colibris.
Acordou em deslumbramento,
seu corpo jazia ao relento,
sua alma cortejava o céu.
O seresteiro atônito para
ante o corpo inerte que
da janela à pouco caíra.
O choro dispara num murmúrio,
no dedilhar sofrido a viola soluça
notas agudas de sincero pranto.
Apologia da dor respondida
nos quatro cantos da amplidão,
em mavioso contracanto,
hino de amor:
“- Oh! tu que a mim vieste
movida pelo amor sensual
da luxúria das alcovas,
das vestes nobres à luz
diáfana de um castiçal,
o meu canto escuta.
Meu casto sentimento brejeiro
engajado nas asas da honra,
qual águia de voo ligeiro,
passou rasante no pântano
onde o prazer efêmero do amor,
na traição de um reflexo,
submergiu no lodaçal de mau odor.”