Confissão de sereias
Eu sou do céu e do sangue.
Sou das ondulações, dos sibilos,
sussurros, redemoinhos,
mares e lagos.
Eu sou a fumaça
do seu trago,
o silêncio que afunda
em teu regaço.
Mas eu cresci nas águas,
nas tormentas,
nas profundidades.
E mesmo assim,
se for preciso
finco minha carne na terra,
crio rachaduras
na espinha ereta.
Se for preciso,
viro pedra, seco rios.
Eu sou das águas.
Mas se for preciso ser sereia
na areia, eu vou.
Não para rastejar,
mas para cantar.
Eu vou me ver fora do mar,
me cegar no reflexo das ondas
e aprender a amar o mar mais uma vez.
Quero que também ouças
o meu canto
ainda que te cause espantos.
Quero que ouças o meu canto
tecido de prantos, de conchas, de gotas,
de singelezas.
Quero que me vejas escamando
ampla e inteira, lançando
oferendas de vozes à beira-mar
costurando nos olhos
um brilho de melodias.
Quero que sintas nos carinhos
das águas, brisas e maresias
um toque de ninfas;
que me vejas menos matéria
e mais poesia.