Te Olho
Te olho, assim, só de soslaio,
De um microscópio - vejo o ranço,
O triste habitat de um micróbio,
Os pelos verdes de um pão mofoso,
Vejo uma ameba, a nadar na profusão
Nas águas de um mar gelatinoso.
Te olho por curiosidade,
(O bizarro sempre me distrai)
Como quem vai a um show de horrores,
De humor indiferente e jocoso,
Num circo decadente , em tarde de domingo,
Só para fugir de um dia chuvoso.
Te olho, pois bateste à minha porta,
Ornada em paetês, cetins e plumas,
Macramés, brilhos, rapapés,
Desarrumadamente torta,
Na face, um par de olhos mortos
E os dedos nodosos, apontando
As unhas sujas para o meu rosto.
Te olho, pois és um bom exemplo
De tudo o que penso ser medíocre,
E tua insignificância me fascina.
Não sei se o nosso desafeto
É destino, carma, doença ou sina,
Mas te vejo como uma latrina
Na qual despejo meus dejetos.
Poema inspirado na imagem - o que um gato orgulhoso pensaria, do alto de um muro, em noite de Halloween, ao observar o cão sarnento que tenta alcançá-lo?