Carta a um amor distante

(De como se consegue enganar a saudade por mais algum tempo)

Nesta cidade tão longe

de minha terra natal

a saudade é meu tormento,

a tristeza é o meu mal.

Sinto saudades de todos,

de tudo o que me cercava,

do ar, da paisagem, do clima,

das ruas por onde andava,

do sol que brilhava sempre

no inverno ou no verão,

daquele calor ardente

das praias do meu torrão.

Sinto saudades do chão

que queimava os meus pés;

o chão que os meus pés queimava

o meu semblante marcou.

Eu tenho o semblante marcado

pela terra em que nasci,

pelo sol, pelo calor,

por todo aquele amor

que eu sinto me terem dado

as pessoas a quem amo

e que agora, tão distantes,

não escutam quando eu chamo.

Os dias aqui são frios,

as noites são tão escuras,

por aqui não passam rios

que embelezem a paisagem

que é seca, fria, inóspita,

triste e não sei que mais;

quero voltar ao Recife,

quero rever os meus pais.

Só é nisso que eu penso

quando estou só em meu quarto:

nesta cidade eu venço

e um dia daqui eu parto

de volta pra minha terra,

o torrão que nos aquece

e que a gente não esquece

nem que viva uma eternidade.

Meu amor, eu vou voltar.

Não desesperes, querida,

pois serei teu para sempre

e te darei minha vida

ou o resto de que falta

(tu bem sabes de que falo),

pois já te dei muita coisa

e nessa hora não calo

para aplacar a saudade

que sinto em meu peito arder

por viver aqui, distante

de ti, este pequeno ser

que é meu todo e que me ama

e que vive a esperar

o dia em que voltarei

(não poderás respirar!).

Meu bem, estou tão distante,

já disse e repito até,

mas quero que sintas quanto

é grande o que te darei.

O que te darei (ou já te dei)

é imenso, enorme, estupendo

(vê se consegues entender)!

É meu amor, meu amor.

São Paulo, 1971