Poesia, o amor posto entre aspas

na palavra que perdura

ou em outras se desfaz

desdizendo o silêncio

e esgueirando-se,

ardendo,

ou em cinzas já desfeitas

mimetizam-se sonhos imarcescíveis e voláteis

apartando a saudade do tempo que passa oscilante

na barra onde os barcos são velas que amanhecem

numa bêbada solidão

consumindo-se em incoercíveis lembranças e desvarios

nuvens,

mansas nuvens,

banidas e tangíveis,

contornam os montes vadios,

vazios,

conspurcando a realidade

os sonhos gritam ruínas

para a paisagem sem eco da eternidade

flanando como folhas ao vento do fim da tarde

ondeando em círculo nas águas

que se abrem nas cintilações translúcidas do lago

volteando o tempo que passa sem alarido nem medos

das madrugadas caminhando

para os arvoredos falando as mágoas dos ventos

cerrando os olhos inquisidores das janelas insones

despertar e sublevar dominados sentimentos

deslindar enigmas na compreensão lúdica do ser

esperar para ser flores

ou o passo esperando a ponte

ou a ausência do caminho

como esperam algumas palavras para serem poesia

opalescentes como serafins

ou uma justaposição de nefelibatos fonemas

sendo a poesia o amor posto entre aspas

o fator em evidência

sendo o leitor

a condição de dois seres

o silêncio

e o espelho desperto refletindo madrigais

no meio da noite insonte

poeta e leitor, então, se encontrarão?