O NOVO ANO

O que muda é um número, um número que transforma um milhar.

A novidade é uma atenção a mais ao datar o cheque.
Ás vezes, o dígito avança, mas a mente escolhe o passado ao presente.

Sem artifícios, troca-se um único algarismo, os fogos explodem.

Os homens festejam e Iemanjá ganha as flores murchas do calor.

Mas o que muda?

O calendário muda para uma versão inédita,
a agenda que ganhei no natal tem cheiro de nova.

As datas nos e-mails, nos contratos e nos processos revigoram a burocracia humana.

De resto, não muda nem a estação, continuo a transpirar num verão implacável.

O ano é novo, a vida segue igual,
com menos futuro para a esperança, porque o tempo se extingue no enxágue das horas.

O que muda então?
Muda você, que misteriosamente me comove mais aos olhos.

Mudo eu, que envelheço sem querer,
sempre resistindo ressentido, inutilmente, aos ciclos da natureza.

Muda o mundo, que me engole,
que me rumina entediado, como quem bebe uma taça de vinho barato.
Um canibal sem fome que, mesmo assim, me devora.
Alexandre Coslei
Enviado por Alexandre Coslei em 01/01/2016
Reeditado em 29/12/2016
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