O Ceifador Da Esperança

A morte vem aí!

Nunca antes anunciada,

Nunca antes temida.

Não assim, nunca...

O medo.

O medo.

O MEDO!!!

Fujam! Escondam-se!

Para onde?

Para onde devemos nós fugir?

Como podemos nós fugir à morte?

(Tão certa que ela é)

E ela aí vem...

Montando seu cavalo, negro.

Negro, negro, negro.

Negro como cada palavra que escrevo.

Negro como cada alma ceifada.

Negro, como o mundo se tornou.

Sentes isto?

Sentes o cheiro?

Morte.

Cheira a morte.

Sabes qual é o cheiro da morte?

É o cheiro de cadáveres ardendo no Inferno.

É o cheiro da morte que lhes passou a mão.

É o cheiro da podridão.

O cheiro pestilento da decomposição

Apressada pelo ceifador,

Pois este tem ainda muito trabalho a fazer.

Eu,

Enterrei minha mulher.

Enterrei meus filhos.

E, agora, preparo-me para me enterrar a mim mesmo.

Chorei-lhes o rosto,

Chorei-lhes a dor.

Chorei-lhes o nome,

A morte não chorarei, por Deus,

Eu serei a seguir.

A vala comum foi aberta.

Nem um túmulo,

Nem um nome. Nada.

Não haverá memória de termos existido,

Nem de termos partido.

Já lá estão quem amo,

E, por cima deste monte de corpos,

Está o meu lugar.

Não há Céu,

Não há Inferno a qual pertença.

Há apenas um buraco na terra,

Na imundice da vida.

Despejados sobre a nossa miséria,

Sobre a nossa estúpida existência...

Os sinos dobram.

E a infinidade já nem se lembra desde quando.

Alguém que eu conheço morreu hoje,

Essa é a minha única certeza.

É essa e a certeza de um fim, nojento!

Não há como rezar por todos eles,

Por todos os que tombam,

Por todos os que se desabam na desgraça.

Mortandade medonha!

Cuidai dos vivos,

Enterrai os mortos!

Olhai para as minhas mãos!

Olhai para as palmas das minhas mãos, por favor!

Digam-me,

Por qual pecado estou eu a pagar?

Digam-me, por favor!

O que fizemos nós para merecer isto?

Por favor, respondam-me!

Que mal fiz eu para morrer,

Sufocado em tamanha agonia?

Por favor, respondam-me!

Deus?

Deus?

Onde estás, Deus?

Por favor, preciso de ti!

Agora mais do que nunca!

Não me faças olhar aqueles rostos outra vez!

Só quero que fechem os olhos,

Que descansem em paz!

Que o seu sofrimento termine,

Amortecido pelos meus braços!

Deus, eu vi-os morrer!

E nada pude fazer.

Eu mesmo os enterrei.

Eu mesmo perdi a esperança.

Eu mesmo caí.

Eu mesmo adormeci,

Nos teus braços,

Meu Deus!

Sérgio Peixoto
Enviado por Sérgio Peixoto em 29/12/2015
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