Sensações encharcadas

(para profª. Marlise Sapiecinski)

I

Passe ----------------------------

-----> Prossiga assim tão depressa

Pelas longas planícies da imaginação.

Prepare-se

Contra as quimeras monstruosas

Construídas de ilusão.

Os pés, assentados ao solo encharcado,

Sentem os flagelos da grossa crosta, que separa,

Da alma em choro, a sensibilidade da mãe Gaia.

Prepare-se contra o fogo morto

Que ludibria, fosco!;

Sempre constante nos poucos pensamentos.

Os calcanhares, como o calcanhar de Aquiles,

Desatinam os frágeis e ardentes cantos de sorte

Sobre as navalhas brutas pregadas no coração.

Prepare-se contra os erros naturais,

Que inoportuna sabedoria deveriam proporcionar (mas nem disso valem!),

Que derivam, ignóbeis, das próprias decisões.

Seria insensato sentir a angústia desta terra

insustentável, que, no amor incondicional de mãe,

Cria a insolúvel essência da vida?

II

O desaguar dos riachos lunares,

Águas de cristalina suavidade

Desembocam sutis no desejo de felicidade.

Como a terrível quimera das impossibilidades,

Que abocanha com extrema crueldade

O esparramado céu estrelado entre montanhas,

Atingir apaixonado o limite do universo,

Recostar-se ao escuro azul das constelações

Para sentir êxtase ao profundo toque d’água.

III

Ah! são apenas pegadas acrobatas

Que repercutem na plateia da alma,

De falsos aplausos, ovacionados deboches e soberba desgraça.

O caminho é triste e vago, sei,

Mas cultivar a vida como a morte às avessas.

Plantar toda a verdade na semente-pedra,

Para que árvores enormes apareçam e nos galhos bata o vento

E crianças possam escalá-los sem medo

E dos galhos arranquem o maravilhoso fruto-chão.

IV

O que estava perdido continua distante,

O imprescindível não pode ser recuperado:

Tumulto interior fomentado por vozes desconhecidas.

Só uma taça de vinho pode acalmar

A escrupulosa sana da não embriagues:

“Medo turvo escorre pelo corpo”!

Queimar os dedos no fogo.

Assar a carne e comê-la na ânsia de quem morre.

A subsistência não foge ao instinto,

Como o abutre tosco da consciência

Que avança sobre a pútrida carcaça do desejo

E devora, sem hesitar, a imagem dos próprios sonhos.

(Gabriel Mayer, 20/06/07)