E se não houvesse dor?
E se for destino incerto, e se for a barca falsa, canoa furada,
apenas mais um sonho de valsa?
E se tudo for apenas uma quimera, ilusão fria,
solitária antessala da espera?
E se for cortina de fumaça e desamor o que te abraça?
E se nada valer a pena e tudo for poeira de alma pequena?
E se houver nem do fruto a semente,
apenas choro e ranger de dentes?
E se ao teu lado, em tua cama, pousa apenas fogo fátuo,
extinta chama?
E se bem antes da quarta-feira
as cinzas se revelarem inteiras em lamento?
E se tens por teto e abrigo, gárgulas frias de perigo
e um telhado de vento?
E se mal começas o caminho, desde o início,
já adivinhas dele os precipícios?
E se no andar da carruagem os cavalos viram ratos
e o príncipe, de repente, for um sapo?
E se o orvalho deixa de ser pérola
e agora lágrima ferida de espinhos é o que rola?
E se uma dor bem antiga vier de longe, de outras eras,
repetindo seu refrão de urtiga?
E se o regato - água límpida, sonho e ternura -
de repente se turvar em desespero e amargura?
E se as palavras, antes doces como o mel,
agora destilam somente bile e fel?
O que resta, enfim, se as estrelas, todas elas, se apagam no teu céu?
E se a primavera se despir de flores, sem colibris,
sem borboletas e sem cores?
E se ficares sem a lua, a vagar no escuro de alma nua,
ausente também de amores?
E se à noite vai-se o sono e em completo abandono
aspiras a brisa entre os ermos,
feito um cão perdido farejando pelo dono?
E se olhas para o lado e nada vês?
Onde o amparo se em mais nada crês?
Se procuras e não achas, e se buscas e é tudo em vão?
E aí, meu irmão?
E se lhe fecham as janelas e você ficou sem porta,
e nem sequer há uma fresta, nem entrada e nem saída,
nada mais no coração resta?
Acontecesse ainda mais e muito mais que tudo isso,
haveria algo a se dizer ou se fazer?
Ficam no ar, de mãos crispadas,
miríades de perguntas a nos interrogar.
E resta ainda um derradeiro gesto
que tenta aprisionar entre o vão dos dedos
a esperança fina, areia que se escoa.
O vento sábio cobre tudo e o coração vira deserto.
Ainda assim, o que importa? Abra os olhos, observa,
há mistérios, há desafios, isso é certo.
Se a vida fosse fácil e tudo viesse assim de mão beijada,
e se nos sorrissem todo dia
os milionários bilhetes de sorte grande premiada...
E se não houvesse osso duro e nem tranco
e nem barranco e nem cerca e nem muro...
Se não houvesse tiroteio cerrado, bala perdida, miséria, enchente,
terremoto, tsunami, fome inclemente, droga, prostituição e vício...
Se não houvesse injustiça, ladrão, político corrupto,
promessas de comício…
Se não existisse doença, intriga, ódio, desavença e poluição...
Se não houvesse guerra e nem luta e nem miséria aqui na Terra,
como poderia o homem erguer os olhos e crescer?
Como a alma se elevaria?
Como se prepararia uma luta contra as trevas?
É preciso ter sabedoria e perceber
que aquele que não carrega a sua cruz
não pode forjar no fogo dos desafios
os gumes de sua espada de guerreiro da luz.
E assim, no silêncio extremo e na solidão mais completa,
ainda assim sonha oásis o poeta.
A vantagem é que seus olhos veem adiante.
Tem olhos de sonho, antevê paraísos.
E, na brevidade do momento que se esvai,
edifica o futuro distante, palácios de rubi, ouro e diamante.
A alma extasiada do poeta segue avante, em espiral,
a transluzir o brilho do seu cordão de cristal.
O poeta compreende, confia e se cala.
É um guerreiro de fé e esperança. Nada mais o abala.
Sabe o poeta que, acima dessas coisas todas,
para além do bem e do mal,
e para além do seu próprio grito
a ecoar pelos mundos sem fim,
há um Deus que pode tudo.
Agora, o silêncio.
E o verso fica mudo.
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Dedicado a todos os escritores e aos poetas desse Recanto...
Para todos os que, apesar de tudo, ainda têm olhos de esperança.
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INTERAÇÃO
""Contemplação""!!!
"Contemplando a dor na minha oculta e sóbria e sombria, sede de vingança, choro e sorrio, com uma lágrima congelada no canto dos olhos"!
(TONY BAHIA)
À NOITE, FAZ SILÊNCIO EM MINH'ALMA
"À noite, em minh'alma, faz silêncio ao ler teus versos...Um incômodo, acomodado se agiganta, levanta e grita: Sacode a Poeira! HOMEM!!! Encara e escarra no escárnio que não és... Sacode sua lança e degola os imorais, os hipócritas, os sem fantasia!...Os pobres de espírito... Estende às mãos aos famintos e faz Prece com eles... Estão mortos de fome, pela avareza humana... Aqueles que não sabem o que é Carnaval e só dançam no bacanal dos infernos, na orgia dos mares sem porto, dos destinos sem cais....(.....)
(Vem) e vira estrelas, antes do amanhecer... Abraça o Sol com as mãos e se derrete em cinzas de vulcão. Deixe que seu corpo vire cinzas e renasça feito a FÊNIX!... Olhe o horizonte, tão distante de tudo aquilo que cremos e faça uma PRECE!... Ajoelhe-se! é para ler ajoelhado!..."
(TONY BAHIA)
Fiquei emocionado com tuas palavras, amigo. Tomei a liberdade de cortar um pedaço em que fazias menção ao meu nome... Achei que o texto fica mais forte assim... De coração, obrigado...
Tuas visitas me fazem bem. Teus olhos veem para além, um horizonte distante em que habitam os de coração de menino espantado e encantado como o teu. Coração de poeta é criança! Alegria, alegria...
(José de Castro)