O JANGADEIRO MORTO
 
 
 
Jangada no meio do rio
Meu rancho pobre
Espera luz de candeeiro
No sapé tenda  de mato
Rodeado de saudade
Passando frio
Passo molhado
Saindo da margem
Olhando paisagem
Nublada
Um nada orienta
Quem sustenta tolice
De viver na calvície
Do tempo sem ti
No ralo retocado pelo
Velório de vento
Que me traz de novo
Até aqui
Compadre viola esfolada
Pelo tocar de dedos
Das artes de outras cordas
Que amarram feixes
Nas orlas
Esperando frutos do suor
Sem dor sem amor
Sem ao menos um calor
Do corpo dela presente
Caliente solo ressequido
Nunca mais te toquei
Deixei morrer sementes
Caminhando no varzedo
Sem medo dos valentes
“Corvos” de espreita
Desejando meu sossego
No aconchego
Primado lar de alegrias
Quando ela sorria
Anis estrelado
Fazia sentir
Sua pele do meu lado
com minhas mãos erguidas
Que matavam fome
De tudo que trazia
Lá do fundo de tudo
Que amava
Sempre havia um espelho
Mostrando meu rosto
Dobrado
No gosto perfumado
Da china que era sina
Pra viver mais um dia
Jangada no meio rio
Escoro teu dorso
Sobre a árvore
Única parceira de vida
Não fujas de mim
Jangada velha
Corrida de laços jogados
Ao leito do rio
Laçava ostras sem pérola
Nenhuma delas
Tinha o brilho
Sintoma de hinos
Que anjos levaram
Pra me deixar solito...
...jangada na beira do rio.