Dia branco

O dia inda guardava hálito de noite

e os pés já conduziam o corpo

entre moradas invisíveis.

Os olhos caminhavam por ruas

brancas de estio,

cortadas por muros e esquinas

repletas de almas pedintes.

A claridade seguiria ofuscante

até ser tingida de intimidade

pelo prato ensolarado de pequi,

munido de aptidões

para saciar uma cidade inteira

de fome adormecida.

Pele e espinhos à prova,

como o viver -

sempre perigoso -

carecedor de cuidados

ao toque da língua

e nas profundezas do céu

da boca.

A carne úmida,

presa às mãos

habitadas por unhas cor de brisa,

fundia,

qual Baudelaire,

volúpia e dor,

maciez e sabor,

enquanto o cheiro forte do fruto

condenava a tarde à ardência do sertão

e a menina de rio ao sonho

de um mergulho fundo

no mar.