A palavra

a palavra

não a espera pela palavra

rito de barro e aflição

murmúrio e essência

finita em número

infinita nos sentidos

e no sentir

leve ou áspero

ranhuras a deglutir o inominável

que vem do homem só e canhestro

e paira sobre o dia etéreo

e intangível

e a noite infinita

e incomensurável

ah! se já não fosse tão insuficiente pensar

e tão indominável sentir

jamais sentiria a saudade que sinto

de um perfume em um aroma de um outro tempo

jamais amaria o amor que eu amo

neste canto silencioso

anteparo e aresta

do meu olhar

e desta comoção que por vezes me toma

diante da inquietação de ser homem

jamais me compadeceria da imagem acostada ao espelho

este outro e mesmo eu

desviando os olhos de mim

como quem toma o mundo pelas aparências

e as noites pelas vozes que me dizem os sonhos

jamais escreveria o desespero que escrevo

jamais choraria as lágrimas algozes

nem em tempo algum as secaria com as costas da mão

sem contestação