O CRAVO EM DEFESA DA MARGARIDA

Uma poesia para mulheres vítimas de violência doméstica

Continuo observado meu lar: o Jardim Estéril.

A margarida se casou cedo com o jasmim

No início tudo parecia muito promissor

Um legítimo conto de fadas, uma lenda

A ser escrita com letras douradas.

O jasmim era um verdadeiro cavalheiro

Porém escondia algo sombrio e nefasto

Sob a máscara de falsas gentilezas da conquista.

O jasmim não gostava de ser contrariado

Na sua doentia concepção controladora

A margarida devia servi-lo incondicionalmente

Na hora em que ele bem entendesse

O jasmim se achava um rei inquestionável

A margarida não era somente uma esposa

Mas também uma abdicada serviçal.

A margarida não percebeu seus desvios de conduta

Até ser tarde demais, fato do qual se arrepende.

Com o tempo a situação tornou-se pior

O jasmim agressivo, por coisas sem nexo

Iniciou uma onda de rotineiras agressões

Físicas, verbais, sexuais e morais

Contra a inerme margarida, que chorava

Suas pétalas quebradas e maltratadas.

Ela passou a sentir-se a cada dia mais feia

Não conseguia achar o seu perfume

Esqueceu-se da primavera e vivia só de invernos.

Ninguém do jardim atrevia-se a ajudá-la

Valendo-se da máxima:

“Em briga de flores ninguém mete o espinho.”

Nessa levada, a silenciosa flor, se perdeu

Acostumou-se a ser saco de pancadas

Afinal, devia ser submissa, sempre a ensinaram assim

O jasmim, por sua, vez era um crédulo no seu direito

De exigir e educar pela força e não pelo diálogo.

Ele reproduzia o comportamento que aprendeu

No jardim de sua infância. Obviamente, que

Para a margarida não era tão fácil denunciá-lo

Mais que tudo, ela tinha medo, e o amava

Independentemente; um amor distorcido.

A margarida não sabia o que seria dos seus filhos

Se ficasse sozinha, sentia-se incapaz e baixa.

Além do mais, o jasmim, não era mal sempre

Somente quando ela o desapontava, a culpa era sua,

Só precisava tomar um pouco mais de cuidado.

E este pensamento da margarida continuou

Ela nunca chegou a falar com o Jardineiro

Numa noite qualquer o jasmim voltou bêbado de pólen para casa

Na tarde seguinte a margarida eclipsada foi velada e as florzinhas

Destinadas a abrigos de outros jardins hospitaleiros.

A margarida não teve chance de se defender

E não terá outra chance de viver e mostrar sua primavera.

Digo as outras flores que padecem deste mesmo mal:

“Não aceitem um amor quebrado que somente fere.”

Ninguém deve viver de migalhas de um falso amor

Nenhuma flor deve perder suas pétalas em brigas.

Femininas flores vernais e maduras achem seu valor

O seu brilho roubado pela opressão esmagadora.

Logicamente que sei que nada é tão simples

E que o adubo da fé, ás vezes, é escasso

Porém não há complicação sem solução maior que a morte.

Por isso, flores violadas, lutem! Vocês são capazes.

Eu nada pude fazer pela margarida, mas estou aqui

Abrindo estas palavras para dizer ao vento:

“Por mais escuro que um jardim seja,

nenhuma flor está de fato sozinha, por favor,

não seja a próxima margarida enterrada

sob o triste manto de um amor infloral.