Meus quase cinquenta anos...
Vou completar cinquenta anos!
Este tempo abateu-me um pouco.
Não consigo mais jogar futsal,
vou correr meus joelhos doem,
salto mortal eu morreria de fato;
o tempo acocorou-se nos lombos.
A ação do tempo é tão contraditória,
na alma ela não atua, segue juvenil;
no corpo um tsunami, mina as forças.
A alma continua menina e sonhadora
e cursa ao contrário do tempo, vai no
rumo de ser menino peralta de novo...
Adultos têm que suportar o peso da
lucidez; eu a levo tão a sério como
a roupa que me veste; o que me salva
é a vontade de ser criança que escapa
pelas frinchas e gretas da casca dura
deste meu corpo velho e me respira...
Se há no corpo a decadência da força;
há, na alma, luares do tempo de criança.
E ainda me cantam os canários da terra,
os peixes dos poços azuis, seus bagres;
o capim daqueles atalhos, o orvalho das
manhãs frias...Depois, adulto, trabalho.
Agora, necessito de silêncio para fazer
um rio no pensamento; antes, eu era o
próprio rio e suas pedras, seus sapos,
os coaxos, as formigas fugindo de pau
oco, os ovos dos ninhos, as frutas nos
galhos, a fome de todos os passarinhos.
Com cinquenta anos de idade um homem
sabe tudo do lamento dos rios e o coração
das mulheres; tudo de saudade, de perdas,
de sonho desfeito, mas não sabe ainda se
ser poeta é graça ilustre ou doença grave.
Só que faz a alma deste mortal mais suave.