SE TIVESSE
Se ainda tivesse o que, eu perderia pra dizer que sim e talvez em troca, em fim, ouvir ranger uma velha dobradiça e se abrir um mundo sem palavras, onde o silêncio só diz a verdade, onde o horizonte traz proximidade e mesmo a noite é claridade.
Perderia se ainda tivesse, sem medidas e tão intenso, refletindo o quanto é imenso, pra dobrar, em fim, aquela esquina que deu medo e adrenalina, e saber que era só escolha, sem as incertezas do misticismo, sem as crueldades do eufemismo.
Se tivesse, ainda que só um pouco, anularia essa tempestade na fragilidade da minha intensidade e com frieza cruzaria os braços para cada passo que causasse dor, sequer rubror.
Se algo tivesse, mas seria tarde ou já nem seria! Como poderia caminhar assim, se até o fim ouvi cada palavra e acreditei com total entrega, o sim que nega, da promessa feita, da palavra desfeita, dos valores vulgares e profanos lugares.
Se ainda tivesse, mas já não tenho. Na aceitação me atenho. Dos sons abstenho. Não mais vocifero dores nem resquícios de amores. Quem vocifera ainda acredita e com resquícios habita na sujidade da esperança e poetiza, mas nada alcança.