DORMIR PARA ACORDAR

onde está a poesia

na intenção de quem escreve

ou no gesto de quem sobrevive?

na agonia, no riso

no muro ou na flor?

no chão, as flores do jasmineiro apodrecem

e no calor da tarde exalam o melhor do seu perfume - e daí?

isso não responde a pergunta "onde está a poesia".

o muro é velho, tem rachaduras e desbota

o que isso diz sobre a vida ou a vida do homem

ou a vida da palavra escrita?

onde está a poesia?

que seja dito, a pergunta não vale a pena

se estarão esquecidos poema, poeta e muro num segundo

como a flor amarela daquela árvore no meio do jardim

apesar do seu perfume

apesar disso,

daquilo

e tudo

a vida anda zonza

de tão informada e quase mais nada conta

ou vale.

a pergunta gira, gira

sobre o muro caiado que resiste rimando vizinhos:

porque escrever poesia? onde está a poesia?

eu não devia, respondo eu

eu, que não me encontro e nunca acerto o tom

eu que não espero admissão e continuo teimando

fiel à mim que nem sabe quem seja

entupido quase enfartando, digerindo mal escrevendo

aceitando que é vida esse gerúndio que não acaba, respondo

pedindo no meu gesto de figueira estéril: ata-me, forte.

pode ser que eu desista e nunca bata em porta alguma

se não tenho mais vontade de entrar.

Antônio B.

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 01/10/2015
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