BOCA DO LIXO

Nunca tive sorte na vida.

Quando nasci,

As nuvens encobriam o Sol.

Era o último filho,

Do último dia,

Da última relação,

Dos meus pais.

Meus cabelos

Irritavam o útero materno.

Nasci agarrado num fórceps,

Nasci com os olhos abertos

Para não ser engolido

Por animais famintos.

Juntaram os nomes

De dois defuntos

Para me dar um nome.

Mal caminhei

E já estava sobre pedras.

Eu pagava os tragos do velho.

Foi o escarro

Do maldito cigarro

Que me roubou os dentes.

O verde e amarelo

Ainda me envergonha.

Mal sabia escrever,

Abri uma conta no banco

Sem assinatura.

Depositei dia-a-dia

Um centavo da minha ira.

Deixava a marca do barro

Nos capachos

Das casas em que servi.

Deitei com tantas

E acordei sempre só,

Apenas um cheiro bom

No meu travesseiro.

O tempo passa para todos,

Vivi para ver.

Aprendi a dar nós em gravatas

E hoje me alimento

Dos mesmos pratos que servi.

MARIO SERGIO SOUZA ANDRADE
Enviado por MARIO SERGIO SOUZA ANDRADE em 25/09/2015
Código do texto: T5394744
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