DIÁRIO

a cada dia que passa
passo roupa, passo raiva
passo mal, a dor não passa
dê-me um paracetamol

a cada dia que penso
penso e fico hipertenso
imenso mundo num lenço
imprensa livre, livre mercado

a cada dia que piso
piso o chão de cimento
chão cinzento e cinzas de cigarros
escarro pingos de paixão

a cada dia que posso
posso cavar o poço e a cova
corro da fúria dos corvos
corto o medo pela raiz

a cadia dia que pulo
pulo as barreiras da vida
vida que vai e se esvai
cai no asfalto e quebra

a cada dia que parto
parto para minha própria parságada
paro na primeira porta
e imploro um pedaço de pão

a cada dia que me perco
perco-me entre prédios e parafusos
pelos pântanos da propriedade privada
e imploro uma partícula de paz

a cada dia eu pioro
pioro de hora em hora
choro um som choramingado
domingo no parque, nenhuma paquera

a cada dia que me prosto
prostituo-me na falsa partilha
sou pobre, seu presidente
sou pobre, seu parlamentar

a cada dia que puxo
puxo o último trago, o último suspiro
puxo o gatilho contra o próprio peito
puxa vida, o paraíso é porreta!





 
Cláudio Antonio Mendes
Enviado por Cláudio Antonio Mendes em 24/08/2015
Reeditado em 24/08/2015
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