À beira do asfalto

Vi

À beira do asfalto

Sob um sol lancinante

Uma linda garota e seu violão

Cantava

Para quem passava

Para quem nem olhava

Para quem conhecia, ou não, a canção

Pessoas que iam

Pessoas que vinham

Com as suas vidas

Com os seus problemas

Com os seus impostos

Com suas doenças

Com a sua fome

Com suas desculpas

Com os seus estudos

Com os seus dilemas

Com as suas culpas

Suas grandes culpas

Com seus mandamentos

Com seus comandantes

Com as suas guerras

Com as suas armas

Com os seus empréstimos

Com os seus dinheiros

Com trinta moedas

Suas traições

Seus pequenos crimes

Suas tentações

São quinhentas pessoas

Que já não a ouvem

Que estão dispersos

Com seus helicópteros

Com seus heliportos

Com todos os seus prédios

Seus arranha-céus

Com seus caminhões

Com suas fumaças

Seus esconderijos

Com suas desgraças

Vi

À beira do asfalto

Sob um sol inclemente

Uma linda garota e seu violão

Cantava para quem passava

Que não a ouviam

Que não sabiam se era na verdade

Sua filha, sua irmã, sua mãe, sua esposa

Ou seu violão

Vi

A menina guardando seus pertences.

Será que ela volta amanhã?

Corumbá, 18 de agosto de 2015