Banquete
Me querem sempre
num banquete;
mesa posta
com pedrarias, pratas,
candelabros,
ratos.
Me querem
com a maçã na boca,
abacaxis, kiwis,
pêssegos e apetrechos.
Saborosa, adestrada,
excêntrica, bela,
mas imobilizada.
Me querem ideal,
intacta, comportada, sã,
enquanto minha carne se rasga
nos becos dos afogados,
silentes afãs.
Perfeição acima de tudo.
Enquadramento,
encaixe, escultura;
nos papéis, nos copos,
nas vestes, nos modos.
E se a perfeição se deitar
com as pedras das ruas,
que pelo menos haja
co-me-di-men-to.
Se rir demais, loucura;
Se chorar, tragédia,
exagero, demência,
tanques de guerra!
O pavor do ser emoldurado
por cofres e esferas.
Mas todas as noites
abraçamos os conceitos.
O conceito de estar satisfeito,
o conceito de estar mudando,
o conceito de estar vivendo;
Liquidez, hashtag, good vibes, namastê.
Os conceitos estão doravante permitidos.
Sim, os conceitos estão permitidos.
Assim toda expressão
segue cansada pelo meio-fio,
enforcada por mil nãos
em busca da perfeição
que irá nos destruir.
As palavras não ditas
irão nos definhar
com um peso de eras.
Mas daqui vejo-a chegando,
prenhe de dinamites,
arames, cordas, vidros,
gaiolas. Vejo-a chegando
altiva, rubra, mística,
mascando barris de pólvora.