Tu
Tu, palavra outra que não eu
E ainda eu em ti a revogar imensamente tudo em nós
E a lançar ao infinito a proximidade eterna
De modo que sejamos nós o abismo
E o abismo seja para sempre tu
Tu, desejo da razão insensata e graça infinita do absurdo
Tu que és o quase em tudo
E eu a desvendar incansavelmente o tudo em nós
E incansavelmente a revogar o lirismo
E o lirismo, manso, é para sempre tu
Tu, aljava de sonhos vazia, mas de sonhos de outrora
E eu a recolher os sonhos lançados pelo mundo a fora
E tu a desfazer displicentemente o tudo em nós
Com uma displicência plena de cinismo
Num lamento cínico choras para sempre: tu
Tu, mãos que colhem, pés que correm
Expressão de minha alteridade
"Onde estarão nossos limites?
Onde és tu, quando eras eu?"
(E os teus pés ainda correm, como espíritos fogem
das fronteiras de nossa herdade)
Tu, eu em vós - palavra ressignificada em mim
E nós ainda a nos sentirmos irremediavelmente perdidos
Na proximidade eterna do infinito
Do abismo em vós
E o abismo para sempre nós