AS DUAS MARGENS DE UM RIO.
Atravessei a rua como quem atravessa um rio.
Um barqueiro me conduziu
de uma margem a outra da minha própria vida.
Na terra dos agaves, deixei a despedida
e a promessa de amizade eterna.
Levei comigo um anjo de ouro dependurado ao meu pescoço.
Segui soprando as minhas próprias velas.
Cheguei à outra margem graças aos bons ventos
que o rei daquelas terras ajudou a soprar.
Desembarquei em um jardim onde havia uma festa,
mãos desconhecidas se fizeram amigas,
minha poesia, então, desabrochou.
As lágrimas que eu chorava foram esquecidas,
já não me lembrava nem da despedida.
Escutava fados sem chorar as lágrimas
doces que causaram dores.
Meu coração se enfeitou para um novo amor.
Se não aconteceu, foi porque o destino colocou uma pedra.
Talvez, eu ainda possa enguiçá-la.
Guardei o anjo de ouro dentro de uma caixa.
Deixei a caixa aberta para que suas asas não fossem aprisionadas e
eu não ficasse presa a um mundo de confusão de cores.
Um pássaro raro disse que minha vida ali se principiava.
Eu enfeitiçada com música e poesia
olhava para a outra margem e a cada dia mais distante eu a via.
Eu ria.
Não, eu não sabia que minha alegria reconquistada era observada.
Da janela do seu castelo alto, lá estava o rei da terra dos agaves
a ouvir meu riso.
Comprou um livro de poesias de um poeta que nunca ouvi falar,
pediu para eu ir buscar - Quer me presentear.
Atravessar a rua em sentido inverso? Não, nem pensar!
Deixa como estar.
O rei no seu castelo alto,
eu no jardim rosado,
com um rio a nos separar.
A amizade é eterna,
mas que viva cada um na margem que está.
Olivia Maria Beltão Gondim
Recife, 07 de agosto de 2015.