Poemas do Beco ( IV ) Mãe Anastácia
Toc, toc, toc.
- Quem bate?
- Cobreiro brabo.
-Te corto a cabeça e te corto o rabo!
Mãe Anastácia era curandeira de primeira.
Benzia cobreiro
criança com quebranto.
dor de dente.
Benzedura feita com reza
e brasa em copo de água.
Benzia tormenta
com cruz de sal
e palma benta
que queimava, junto á porta da frente,
numa tigela de barro.
Tinha sempre um remédio,
para qualquer enfermidade,
na horta do ranchinho
onde cultivava certas ervas milagrosas:
guiné
quebra-tudo
arruda
espada-de-são-jorge
e chá de todo tipo.
Mãe Anastácia
nunca cobrou um tostão de ninguém
mas gostava muito de ganhar:
biscoito
marmelada
goiabada
e qualquer doce vindo da Argentina.
Conhecia simpatia
para qualquer necessidade:
para mulher conseguir marido
para passar de ano no colégio
para cortar soluço
para tirar verruga.
Se alguém se lastimasse,
fazia uso de uma santa compressa:
catinga-de-mulata com arnica.
Certa vez fui lá com dor de dente,
ela mergulhou uma brasa num copo de água,
fez uma reza num palavreado estranho
e foi batata...
O mesmo que tirar com a mão.
Mãe Anastácia,
bem velhinha e bem pretinha
(diziam que era neta de escravos)
de tão bondosa que era
não tinha nada de seu.
Era um anjo bom
que fora morar no Beco
para o bem vencer o mal.