Futebol

Domingo.

O sol desponta com seus raios fúlgidos

no azul e límpido céu

como havia sido previsto pelos meteorologistas.

Não iria chover e não choveu.

A cidade acordou festiva,

é dia de Flamengo

e quase toda a cidade é Flamengo.

As cores rubro-negras dominam

e por certo dominarão

por mais um longo tempo

o coração de seus habitantes.

Um grito uníssono nasce na Gávea

e ecoa, desde cedo, pela cidade:

Mengo! Mengo! Mengo!

Já estou imaginando o Maracanã

— o maior estádio do mundo —

repleto de gente.

Gente unida

gente carioca

gente brasileira

gente feliz.

Gente que entende de futebol

gente que vibra

vive

e até morre pelo seu Flamengo.

Gente que esquece o dia-a-dia

o trem da Central

o trânsito congestionado até o estádio

a volta, quase sempre,

aos bairros favelados.

Gente que se encontra

sem distinção de sexo, cor, raça...

...nem credo.

Mengo! Mengo! Mengo!

Gente, muita gente.

Estou imaginando a massa

alucinada

e alucinante

nas gerais

arquibancadas

numeradas

e cadeiras-cativas.

Ai de quem se atrever a vaiar o seu Flamengo.

Ai de quem enfrentá-la.

Corre até risco de vida.

Prevendo isso é que

lá se encontram, também, os policiais

— muitos deles sem nada entender de futebol —,

seus cães amestrados

e suas bombas de gás lacrimogênio.

Estão prontos para intervir

se necessário for.

A presença deles funciona como sedativo

aos torcedores mais exaltados.

Mengo! Mengo! Mengo!

Uma pequena escaramuça surge nas gerais

e é logo contornada pela

turma-do-deixa-disso.

Não será desta vez que a polícia

intervirá.

A massa está lá para assistir a futebol.

Brigas,

desavenças,

deixemos para os

vietnamitas e africanos

gregos e troianos.

Mengo! Mengo! Mengo!

E eu,

que não sou flamenguista

(sou botafoguense),

tenho que ficar calado.

Não posso me exaurir antes do início

do jogo. Reservo as minhas forças

para os noventa minutos. O meu grito

precisa se fazer forte.

O alvinegro precisa de mim

e eu não posso desapontá-lo.

O estádio parece vir abaixo.

Mengo! Mengo! Mengo!

Eu,

continuo com os olhos fixos

na boca do túnel

e ensaio o meu grito:

Fogo! Fogo! Fogo!

(1978)

Genésio dos Santos
Enviado por Genésio dos Santos em 30/06/2015
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