Mortes diárias

Estou fadado a morrer

Duas centenas de vezes a cada dia

Preso nas masmorras

Dos meus sonhos infantis

Seguro as minhas calças caídas nos quadris

Esbarro nas paredes afetado por modorras

Estou fadado a morrer

E o pensamento dessa morte vira fumaça

Quando alguém grita e tudo em mim se irrita

E eu perco o compasso

Da vontade

E da morte

Eu morri hoje pelas mãos de um carrasco

Na forma de uma música desafinada

Que saída d'uma garganta desgraçada

Cheia de mucos que me davam asco

Eu morri hoje dormindo

Morri caindo e morri acordado

E meu coração doce agitou-se

Achando que era o culpado

Enquanto o cérebro ria

Meu Deus, eu vou morrer todo dia!

Eu tenho tanta coisa a fazer

Eu tenho um mundo cheio de amanhãs

Eu tenho um quarto de hora

E uma estrada adiante

Tenho uma faca na estante

Tenho uma vontade, um afã

De não fazer nada agora

(Façam silêncio - quanto barulho!)

Se eu pudesse falar, falaria

Mas os ruídos inquietos inquietam o sono do povo

Amanhã eu vou morrer de novo

Pois fadado estou a duas centenas

De mortes pequenas

E três catástrofes enormes

Que me deixam co'a mente disforme

Tudo isso me acontece num só dia

E por incrível que pareça

(pensa a cabeça quente apoiada numa mão fria)

É tudo tão familiar...

Áquila Teófilo
Enviado por Áquila Teófilo em 19/05/2015
Código do texto: T5247873
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