Tudo vira poesia
De tudo se faz poesia.
Até mesmo
de uma inspiração vazia.
Em tudo o que existe habita a poesia.
Mesmo num coração desolado e triste.
Maré cheia, maré vazante,
grão de areia, peixe, estrela, concha
e baleia e águia e montanha.
Tudo vira poesia.
Vida e morte, sol e lua,
azar e sorte, roça e rua.
Há poesia em todos os quadrantes,
em todas as dimensões do universo.
Há muita poesia nos rios,
todos esses que seguem para o mar
e naqueles que desaguam em outros rios
e também nos rios feito lágrimas
escorrendo devagar.
Tudo vira poesia.
Uma lua redonda e amarela, principalmente.
Lá de cima, luariza a moça nua
que a espia da janela. Talvez você.
(isso são versos ou seria uma pintura de Monet?)
Mas e se a lua for magrinha?
Ficará sem versos, triste e raquítica?
Qual o quê!
Lua anoréxica também é bonita de se ver.
Parece uma unha,
um cisco de luz acariciando o céu.
Poesia é feito mulher bonita,
bem melhor que rapadura.
Tem doçura de mel
é anjo e é musa a inspirar a lida.
Mas pode ter um travo de amargura,
que nem só alegrias desfilam nas passarelas da vida.
Até mesmo a tristeza se veste de alegria.
E pode o verso virar no avesso
a sisuda melancolia.
E a noite, pode ser poesia?
Enfeitada de estrelas, a noite mais escura
acende o cristal do translúcido verso
que ilumina e inebria.
E paixão? E amor? E ciúme?
E espinho? E flor? E perfume?
Tudo o que é grande
e mesmo o que é pequeno,
desimportante, miúdo e insignificante
pode se transformar em poesia.
Uma ferradura velha
um trinco enferrujado
uma porteira de roça
um vão de rio, uma canoa
um grão de café, um bode,
um sapo na lagoa, um tatu
e uma muriçoca,
um pendão de milho
uma faca de cozinha
uma escada quebrada
uma panela de ferro
um jardim abandonado
uma boneca de louça
um penico de ágate
um laço de fita, um guarda-chuva
uma andorinha, uma flor, um cão
um fogão a lenha, um pote de barro
uma gaiola e um gato
uma fotografia amarela de tempo
um botão de madrepérola
uma borboleta azul.
Tudo tem por trás uma história
tudo isso nos ilumina por dentro.
As pequenas coisas nos fazem pensar grande.
Quão vasto é o mundo!
Esse pequeno grande mundo, ele mesmo,
inteiro, cabe todo dentro de um só poema.
Hoje é dia de viver poesia.
A poesia que cabe no bolso de uma criança,
passa no fundo de uma agulha,
me acende um vaga-lume nos olhos,
e incandeia e brilha.
Poesia semente brotando sem fim.
Poesia de ti reinando em mim.
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Dedicada a todos os poetas do Recanto das Letras