CINCO PRIMAVERAS

lembrei-me cedo de teu aniversário

e quis rodear-me de balões de borracha

tal qual uma tola criança de barba

agarrada a um guaraná de garrafa

lembrei-me de teu pai, sorridente

e de tua mãe atenta aos quitutes

todos tão jovens e tão frágeis

naquele tempo de gigantes mamutes

são tantos anos de caixa e gaveta

que o pensamento tinge-se de amarelo

as vozes morreram nalgum canto da mente

e os parabéns jazem num universo paralelo

dei-te presente de embrulho e laçada

um brinquedo do tempo da vera madeira

tão colorido que jamais esqueci-me do matiz

nem do tom que dava à brincadeira

lembrei-me também da gente grande falante

expondo os dentes em assuntos que eu não sabia

o beijo duma naquel´outro entre outros afagos

e a dancinha marota onde paixão ainda cabia

lembrei-me do bolo sobre a toalha de heróis

agora tão desbotado que não há como atribuir-lhe sabor

a fileira de doces à um passo de ser vitimada

pela malta insana de fadinhas e caubóis

tantos anos de mofo e apego

que nem as aranhas ousaram tecer

teia alguma sobre o presente

que ao passado nada tem a dever

despedi-me de ti com um mero aceno

e vi aquele sábado se dissipar

naquela noite tive a pueril certeza

de quão divino é sonhar

até hoje eu sonho

com aquele dia em particular

tão feliz em sua concorrida companhia

tão feliz no meu coadjuvante participar