LEGADO DE ALÉM-MAR
o leve bater das asas, do açor em breve revoar,
do silêncio das casas, do aceno de lenços no cais,
do sonho em quimera no legado de além-mar
à nova terra a espera do semeio dos casais.
Na alvura das velas montando sentinela
Pousando de norte a garça era um duende,
em prenuncio de sorte na terra prometida
pra o alento de gemidos e dores latentes.
A nau era a mão que o sono embalava.
Na proa ia esperança, na popa o adeus.
O mastro era pena riscando poemas
no pontilhado luzeiro de estrelas do breu.
O chão da província pôs fim ao balanço
e o guaiba em remanso fez da âncora a enxada,
que sulcou o campo sem trégua e descanso,
e a colheita o alivio das mãos calejadas.
Brotaram cidades da virgem pampa sulina,
ao açoite do minuano nas noites de frio,
e o clarão das fogueiras das festas juninas
deu a luz à capital nas margens do rio
O prazer do sossego da faina de sol a pino
esquecido nos folguedos que ao silêncio deu fim,
tem o gosto de quindim adoçando os beijos
dos namoros nos festejos e cantorias do divino.
O mastro da nau agora é pau-de-fitas
entrelaçando os sonhos que a safra realizou,
é a frondosa natureza que os galhos abana
numa celebração lusitana do povo que aqui chegou.
A fome do saber foi saciada no "pirão de alguidar"
e as cantigas de ninar brincavam de dançar na roda,
e a pandorga pincela a mistura cores no anil de fundo
na aquarela de cultura que veio pra unir dois mundos.