Dentista
tento escrever,
mas a visita ao dentista não me sai da cabeça
- pode sentar, por favor...
estende a mão em direção à minha boca
- abre... grande, vira, morde...
examina,
examina,
examina...
olha os dentes com a mão
e olha com todo o ser a farta ausência de dentes
suspira,
como se a falta de dentes fosse nele e não em mim
arrima os olhos com o espelhinho
a raiz exposta
que bosta
findo o exame
calcula,
calcula,
calcula...
no computador
sem puta dor me diz:
nada que dez mil reais não dê jeito
indeciso,
penso com o siso que não tenho
e nem juízo também
coisa parecida só no Inferno de Dante
falta-me a noção da mais-valia dentária
R$ 10.000,00???
SUSTO!!!
uma dor imprecisa,
a boca que insiste em ficar aberta,
cada vez mais aberta
sorrio, amarelo e banguelamente
uma súbita falta de ar
a usual falta de grana
a anti estética falta de dentes
o gosto amarelo-esverdeado da saliva seca
misturou-se a este gosto metálico
de sangue azinhavrado na boca
...
Eu vi, outro dia,
um carro ofertado por R$ 2.500,00
Olhando, assim, o binômio
carro/dente
o meu sorriso sem dente
que era fácil e contente
entra, indubitavelmente,
para o meu ativo permanente