Gato Negro
Pata mansa e olhar ferino espreitavam no telhado,
Todo dia aciado, gato organizado, ligeiro, sagaz.
Sem perder a elegância de um belo príncipe vivaz
Observava de longe o movimento do povo atarefado.
Com flexibilidade se esgueirava entre os escuros becos,
A procura de um rato, um prato comum para o gato se alimentar.
Coitado do gato sozinho, pesaroso a ouvir galhos secos,
Sem amigo ou dono para lhe afagar, sem ninguém para lhe amar.
Vivia nos muros, tão meigo de um lado, tão frio de outro lado.
Era imperceptível ao passar, tão só, invisível a vagar receoso,
Olhos azulados, corpo musculoso, tão noite seu pelo, arrepiado.
Se lhe viam corria de medo do povo que o temia supersticioso.
Tão sensível ele era, um dia encontrou um dono amigável,
Lhe acolheu, abrigou, deu um lar carinhoso e até o inspirou.
O gato de olhar cor do mar virou poesia de seu dono amável,
Dedicou-se ao dono e a família, viveu como rei, até que acabou.
O pobre do gato voltou logo as ruas, sumiu, ficou entre os matos,
Ficou mais receoso e não quis mais ninguém, se fechou para o mundo,
Só queria um dono, um aconchego, um amigo e apenas uns ratos.
Se descuidou, a carrocinha pegou, ficou acuado, preso, triste e imundo.
Mas um dia fugiu queixou-se de tudo, resolveu morar no forro de uma casa.
Lá tinha comida, sombra e calor, não precisava de amor ou abrigo.
Certo dia saiu, encontrou um grupo no mato assando peixe na brasa,
Pegou o peixe da estaca, o homem queimou-lhe e o jogou no trigo.
O gato estava ferido, branco no chão caído, sumiu de repente,
Nunca mais voltou ali novamente, se isolou e viveu num tronco.
Tornou-se tigre feroz, onça brava do mato, firme e resistente.
Não quis mais companhia, quem passava tremia ao ouvir seu ronco.
O gato negro cansou de caçar quem lhe amasse, isolado se manteve,
Mas de novo alguém lhe achou, porém desta vez não lhe abandonou,
Foi feroz e agressivo com uma menina órfã, que um dia com ele esteve.
Oferecia tanto amor e recebia tanto ódio, mas ao seu lado continuou.
Até que o gato se foi e deixou-lhe apenas um rato abatido de presente.
Ela chorou, para ele ninguém jamais o deixaria outra vez contente.
Viveu de coração partido, pois o humano lhe fez esquecido.