Maria Beata

Maria Beata

maria da graça almeida

E lá vai ela...Maria Beata.

Maria no nome e na intenção.

Beata na fama e na devoção.

Na brejeirice exagerada,

segue solitária de corpo e coração,

bamboleando pela calçada

-a passarela dos anônimos-

onde, sob a chuva,

experimenta o sabor

e as delícias do despudor.

Displicente, joga o cabelo pro lado.

No cós da saia de seda,

mais algumas voltas

liberam-lhe os joelhos

e um palmo de coxas bronzeadas.

Na blusa bem passada,

certo jeito...e os ombros, à mostra.

Esquisito, um riso de tara

estica- lhe os lábios lambuzados

no batom que os mascara.

Do alto da construção, homens assoviam.

A água cola-lhe a blusa branca.

Sob a transparência da lingerie rendada,

o bico teso dos seios perfeitos.

Endireita as costas, empina as nádegas,

sacode a cabeleira.

Ondulantes, os quadris dançam sob

a melodia de um coro

de demônios insatisfeitos.

Os olhares na altura vibram. Aplaudem.

A água desce-lhe pela face, molha-lhe o colo,

lava-lhe as pernas depiladas.

Gotas preguiçosas chegam ao tornozelo e descansam

no sapato de fino trato.É o fim do percurso.

Vagarosamente, desnuda o busto.

Num remexer de ombros,

sacoleja os seios, de vez, nus. Dobra-se.

Com gestual audacioso, ensaiado, agradece.

Lentamente fecha a blusa , recompõe-se.

Insana, a gritaria desce dos céus, enche a rua.

De soslaio, Maria confere a privacidade.

Transeuntes desavisados olham -só para cima-

em busca da algazarra e do vozerio troante.

A mulher disfarça. Mantido o segredo,

calada, apertado o terço entre os dedos,

retoma a caminhada, elegante, imaculada.

Da solidão acompanhada, segue Maria Beata,

incólume. Recatada.

Um bocadinho de festa aos olhos

ermitões custa pouco! Quase nada...

maria da graça almeida
Enviado por maria da graça almeida em 20/09/2005
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