Aroma dos ventos

Ao longe sinos dobram anunciando

a noite que nos falseia a morte

entre o adormecer e a inconsciência

capciosa do sono

Eclode, no centro do meu sonho,

na metáfora da minha morte,

um lago

a molhar-me os pés da infância

e onde bateia-se os arcanos de agostos

No lago um patinho feio desliza sua feiura

e sua timidez

a debicar o momento

Por entre as hastes dos juncos

a névoa espreita,

ressumando, lentamente,

pequeninas gotas de orvalho

na face da última estrela da manhã

O peso do orvalho gira e escorre

ao passar do vento cinzelando

o poema que se aninha no vir a ser de um flor,

nos passos hesitantes da criança que se põe em pé,

na greda macia e silente

onde um demiurgo molda a simplicidade do velho dia

Na sombra que enlaça o lago

pousam os primeiros pássaros

trazendo consigo o céu original

e o lume da primeva estrela,

da lua primordial,

acesas em mais uma aurora infrangível

por onde os sonhos perpassam a essência do devir

deixando ao redor a solidão do aroma dos ventos

e por onde a escuridão se esbate

úmida de sereno,

acordando os girassóis

e debruando com as primeiras luzes amareladas

a candeia sonolenta do dia

e os oblongos ventos úmidos de sol