Ausência

Tremeluz na tarde o oscilar

lento do tempo

No horizonte nimbado de sombras

o sol, alheio a tudo, derrama-se

molhando o mar de pressurosos vermelhos

O silêncio ilumina

e arde na espera escura pela noite

O vento vela a quietude

de um céu imoto

e sopra nuvens branquinhas

cinzelando o azul denso e friável

O mar é um plangente segredo

que molha de sal e saudades

as ilhas debruadas de rochedos

as ilhas hesitantes dos meus medos

Folhas balouçam das árvores

As crianças cantam e apascentam

a miscelânea de cores e rumores

que urdem flores num jardim

onde as cigarras cantam até o fim

É primavera

A brisa traz o mar e as ilhas adormecidas,

pelo canto das aves, rumor de fontes,

compassos da aragem sussurrando

por entre ternuras e lírios

A brisa sustém a gaivota

carregando gravetos para o ninho

O rio soluça amalgamado

às margens, que o reprimem

A tarde vai se imiscuindo aos morros

O sol descreve um arco

refletindo-se nas águas do rio,

dourado como a tarde e os ventos

que sopram melodias nos bosques

e nos girassóis tocados pela noite

e pelo ciciar das cigarras

A vida se desvela como em tantas

outras tardes,

como em tantas outras épocas

Não obstante,

tudo é ausência