Espectadora


Eu ando pelo mundo feito espectadora,
Eu vejo a dor e o riso nas esquinas,
Nas calçadas, os sonhos caídos,
As bandeiras e os hinos,
Os destinos.

Me sento na praça, as pernas doridas,
Desencantada da vida,
Desejo o horizonte que ninguém anseia,
Pontuado de marés vazantes
E cheias.

Eu levo comigo um pequeno caderno,
Que me abre as portas do céu,
E as portas do inferno,
E nele eu escrevo as minhas impressões
(Que a ninguém interessam)
-Reflexões...

Eu ando pela rua como quem se perdeu,
E perdida, encontrou novos caminhos,
Alguém para quem as ausências 
Tornaram-se novas presenças,
As certezas absolutas,
 Meras crenças.

Eu fico cansada de tanto enxergar
De tanto fechar os olhos,
De tanto dizer e calar,
Pois sei que no fim,
No fundo, nada fica,
Nada vai sobrar...

Eu sou andarilha que não deixa marcas,
Meus pés pisam o chão sem desenhar pegadas,
Minha voz, o vento apaga,
Meu olhar deita-se sobre as paisagens
Sem deixar manchas,
Minhas mãos tocam o vazio das coisas,
O pó da estrada.

Um dia, nem este poema,
Nem esta página, 
Nem mesmo os tremas...

Pois sou espectadora que não aplaude nada,
Não é aplaudida,
Não vaia,
Não é vaiada,
Eu não sou forte nem fraca,
Eu olho tudo,
Mas não sou vista
Nem vejo quase nada.

Eu sou um espectro
Do meu próprio verso,
O reverso da rima
De uma poesia confiscada.




 




 
Ana Bailune
Enviado por Ana Bailune em 19/03/2015
Reeditado em 19/03/2015
Código do texto: T5175712
Classificação de conteúdo: seguro