Oito Horas
Meu texto é superficial,
é a arte do camaleão, é balela.
Sob toda essa fria camada,
que ninguém sabe ser tênue,
há açúcar e outras coisas afáveis,
uma bombonière de surpresas.
Apenas me disfarço dos meus pares
no ambiente de trabalho,
a preço de minha discrição.
Depois, me desfaço deles.
Mês passado fez oito anos
que me prostituo, fazendo tudo
o que não gosto, oito horas por dia,
cinco dias por semana.
E com mais oito horas de cama,
quase não vivo, às vezes, no mais, existo.
Essa maratona deixa a música baixa
e a poesia embaralhada
e se não sinto o gosto da palavra,
tudo é fome e enjôo.
Meu antegozo é saber
da efemeridade das coisas,
é saber de tudo que não sei,
e mora logo ali adiante.