Quanto amor

Quanto de amor está presente naquilo que a gente faz

se tudo se faz sem passado ou consequência

ou numa parvoíce desatenta?

Às vezes lembro-me de sorrir às pessoas

e pássaros voam e vão pousar nos pendões do trigo

que tremem ao sol e deixam cair sementes

Raramente as ouço

Olho-as, mas não as vejo

São as nuvens de ontem que passam

e apagam sóis e derramam chuva

que os espantalhos bebem com suas sedes imóveis

O mundo é um grande alcobaça

encobrindo os insondáveis corações de tanto sentimento

O que cada um tem pra mim no íntimo da sua madrugada?

Não basta ter e/ou sentir amor, é preciso expressa-lo

É preciso amalgamar o amor aos átomos

Talhar com amor o dia-a-dia

Sem pressa

Suave/mente

Sútil/mente

E/terna/mente

Há um mundo diferente esperando gestos de amor

E a recordação do silêncio que ainda não aconteceu

E do grande amor que nos trouxe aqui

Apesar do nosso medo

O amor é um sopro morno

O instante quando o homem é singular e divino

O amor é essência

Premência

É o aroma das flores

É a eloquência dos sinos

Alforriando corações

É o vento passando, refrescando o momento

O amor é palavra antiga

mas o amor não está na palavra

a palavra é só palavra

signo

som articulado

Silenciosa

Despovoada e vazia

Fragmento das sombras e dos enganos

Que se locupletaram em meu peito

Tateio a vida, mas não a toca com amor

Falo de amor, escrevo sobre o amor, mas minto

Nem bem acorda o dia

Meu amor se comove, mas não se move

O amor em mim ficou ardendo na solidão

e no abandono

das cartas que nunca mande

da poesia que não consigo escrever

do céu constelado pelo qual me encanto

e que só posso olhar e sentir sem tocar

da tua lágrima que eu nunca sequei

do choro dos sonhos e das sementes

da tua mão estendida que eu nunca afaguei

da tua dor e a tua nua pobreza cheias de resignação

desta sensação que me toma

e fecha meus olhos

e me enche de mundos e coisas possíveis

Esquecer a palavra

Desaprender a culpa e o medo

Manter os olhos abertos

O coração desperto

Despertas a compaixão e a ternura

Repetir o gesto e o gesto

Dar de beber aos Deuses

Que em nós habitam

Trazer o amor de volta pra casa

E fazê-lo acontecer na vida

Motivo soberano

Suave

Acontecendo entre o humano e o divino