Evoé
As bocas se arregalam comendo as palavras,
O riso dilatado dilacera a fronte,
O gozo torpe desmembra o corpo
Espalhando os membros imersos em um crisol etílico
Que misturam todos para estabelecer o estado do Caos,
A unificação de símios belos em uma orgia bacante
Carregando nossa própria cabeça de leão,
As órbitas giram desesperadas
Procurando o antigo ser isolado,
O veneno verde de Verlaine
Dissolve as córneas revelando o agudo olho
Clarividente que ilumina a beleza de Calipígea
Inflando o duplo prato níveo que assomam o animal cru
Cheirando ainda a flor de carne que o expeliu
Para engolir o sangue maciço que a abastece
De germens de plasma branco-prata
Feitos em estufas testiculares,
Belezas depravadas pelos trajes obscuros do pudor
Que nos enfeou na sobriedade da criação da Polis,
Linhas de razão cerzidas para nos vestir
E amarrar nossa natureza primeva
Quando no Éden ainda não tinha se experimentado
O fruto que veio a chamá-lo de Jardim das Delícias,
Nossas virulentas veias impregnadas de veneno viril
Coberta pela pele que arde e alarde as cores lúbricas
Onde são plantados os pelos
Hirtos pelo prazer de se olhar com fome,
Foram trocados pelo rosto pervertido do pudor
Contemplados na realidade civil
E o vinho precisou ser reinventado
Para trazer a tona nossa beleza primordial
Picando de vida os compassos brancos da existência,
Mapeando notas marcadas pela distância do silêncio,
Encontrando a melodia da febre que compõe nossa identidade
Costuradas ao esqueleto que quebramos e espalhamos
Para enlouquecer os arqueólogos que procuram
Uma verdade harmoniosa já esvaída pelo tempo
Em nosso fértil e pestilento sangue embriagado.
15/02/2015