CUNHAPORÃ - UMA HISTÓRIA DE AMOR - PARTE 02
CUNHAPORÃ - UMA HISTÓRIA DE AMOR - PARTE 02
Para quem está chegando agora.
CUNHAPORÃ – UMA HISTÓRIA DE AMOR é um poema-romance épico, composto de 271 estrofes e 1495 versos, dedicado a Gonçalves dias. Por sua extensão, ele será publicado em 9 capítulos semanais.
Para que o entendimento do enredo não se perca, procure ler a partir da PARTE 01.
Se Mestre Gonçalves Dias, de onde estiver, puder considerar este trabalho como retribuição a tudo de belo que nos ofertou, fico feliz, porque o simples fato de falar seu idioma e poder ler sua magnífica obra nos originais, já me torna um felizardo.
JB Xavier
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CUNHAPRÃ - Parte II
O LAGO ENCANTADO
Brincando n'água,traçando planos
No amanhã,
Na pedra imensa descansa linda
Cunhaporã.
Os olhos negros, tal qual a noite
Mergulham fundo
Naquelas águas, buscando a fuga
Para outro mundo.
Tudo está calmo, a lua brilha
Lá dentro d'água,
Trazendo à tona toda a tristeza
De sua mágoa.
Qual seu destino? que triste sorte
A aguardava?
Tornar-se esposa, unir-se àquele
Que não amava.
Assim nas noites de agonia
Vinha contar
Sua sorte ingrata ao lago amigo
E ao luar.
Nas águas calmas. claros espelhos
Se desfaziam,
Lágrimas tristes, cheias de dor
Em si caíam.
A Lua e o Lago, então, amigos,
A abraçavam,
E envolvendo seu corpo todo
A consolavam.
Seus grandes olhos, seu corpo longo
Amorenado
Brilhava à Lua, deixando o Lago
Apaixonado.
Seu coração vibrante e terno
Em si trazia
A esperança do amor que a ela
Viria um dia.
E prometida a Ygarussú
Estava agora.
O casamento se aproximava,
Chegava a hora.
Tão linda e bela, Cunhaporã
Todos queriam,
E Ygarussú, bravo guerreiro
Todos temiam.
Ele a queria, e mais que isso,
A desejava.
Era por ela que guerras loucas
Ele travava.
Jassy, a lua, sua madrinha
Que sempre ouvia
Cunhaporã e seu choro manso
Se enternecia.
"Minha menina, que mal te aflige
Que choras tanto?
Há muito vejo teus lindos olhos
Em triste Pranto...
Que é dos tempos que aqui cantavas
Sem teres mágoas?
Deixando os peixes apaixonados
À tona d'água?
E teu sorriso, que a noite escura
Iluminava?
E o viço louco que de ti, toda,
Se exalava?"
"Minha madrinha" - disse chorosa -
"Será meu fim!
Ygarussú , o Grande Chefe,
Prefere a mim!"
Então o ouviu-se uma voz maviosa
Surgir cantando,
E a selva inteira parou a ouvir
Yara chegando.
Surgiu do lago, de suas águas
Enluaradas,
A bela Yara, pele morena
E aveludada.
A voz de anjo soou tão clara
E enternecida,
Cantando o amor, a alegria,
Cantando a Vida...
"Minha menina, a cada fim
Há um reinício...
Saia de perto dessa beirada
De precipício...
Jassy, a lua, aclara sempre
o teu caminho.
E o lago amigo, se o quiseres,
Será teu ninho...
Não chores mais, o Bosque inteiro
É teu amigo!
E onde fores, nesta floresta,
Irei contigo...
Ygarussú é apenas força,
Ignora o amor.
Nunca aprendeu como se trata
Uma bela flor...
Vai, minha menina, para a aldeia
Repousar.
Jassy a lua, irá contigo
Te iluminar...
O vento sopra de muito longe,
E traz no cheiro
Um amor ardente rasgando um peito:
Gentil guerreiro!
Ledo cavalga, e vem dos pampas,
Do lado sul,
Dos verdes campos, prados bonitos
E céu azul...
Vai, minha menina, para a aldeia
Repousar,
Que teu amor vem cavalgando
Sob o luar..."
* * *
E Cunhaporã, olhando Yara,
Sorriu às imagens que a mente criara,
Pensando no belo e gentil cavaleiro.
seria o amor que tanto esperava?
Seria, afinal, o amor que chegava?
Sorriu e afastou-se em passo ligeiro.
Andava e sorria feliz e contente.
Nos olhos o amor, incontido, latente,
No corpo o lume que a consumia.
Na mente a infinda e terna espera
Lembrando das coisas que Yara dissera.
Jamais sentira assim, tanta alegria.
Parou, estacando ao fim de um instante.
Ali à sua frente estava o gigante.
Nos olhos um brilho estranho trazia.
Saiu de seus sonhos dos pampas do sul.
Aquele à sua frente era Ygarussú .
Sentiu-se num instante tão só e vazia.
O grande oyakã , sisudo estacara,
Sondando com o olhar o que a mente ditara.
Sorriu num esgar um riso matreiro.
Mãos calejadas em faces ardentes,
Rolaram dos ombros aos seios tão quentes,
O corpo gigante vibrava inteiro.
A moça olhou para a lua tão clara,
Lembrou-se do lago e lembrou-se de Yara,
E de como dissera estar sempre por perto.
Sorvida em abraços do forte guerreiro,
Ouviu à distância o bote ligeiro
Da onça faminta naquele deserto.
Urros e gritos na mata ecoaram,
Morte e agonia aos céus se elevaram
E a selva acordou com o ruído da luta.
Cunhaporã bendisse sua sorte,
E viu mãos e garras ferindo de morte.
Afastou-se correndo daquela disputa.
Foge criança. Depressa, menina!
Yara te salva e Jassy te ilumina!
E a voz maviosa ela reconheceu.
Abrindo caminho na mata com os braços ,
Rompendo os espinhos e mil embaraços,
Á aldeia chegou com o desgosto só seu.
Mais tarde, a taba agitada e atenta,
Ouviu o silêncio seguir a tormenta
Que a luta causara pelas cercanias.
Ouviu o portão da aldeia se abrir,
E em meio ao negrume da noite surgir
O grande Oyakã , que ferido, sorria.
Os dias passaram em festas e danças
Das tribos guerreiras e das vizinhanças
E todos sorviam o amargo cauim.
E Ygarussú, o gigante, cantava
Sua luta de morte, e como, com a clava,
Pusera ao felino um rápido fim.
“Olhei para o lado e vi o felino!
As chamas nos olhos, o instinto assassino,
E instantes depois caiu sobre mim.
Rasgou-me a carne, feriu-me por certo,
Deixei-lhe, no entanto, o crânio aberto!
É esta sua pele. Que reine o festim!”
* * *
Próximo Capítulo: "QUANDO CHEGA O AMOR"
Até lá!!