BOM OLHADO
é um quase espanto
meu contentamento
frente à realidade áspera dos dias
sinto-me feliz
sinto-me inteiro
regenerando os pedaços perdidos no caminho
inteiro
puro
duro
maleável
solúvel como metal líquido indestrutível
de super andróide de ficção-científica
potentes são meus olhos
a contemplar o meu redor
a abençoar gatos, cães e passarinhos
a receber as dádivas da terra e da água
neste fluxo
de entra e sai
de bons e maus olhados
: meu superávit de bem-quereres
um quase santo
um quase louco
a controlar o ar que me rodeia
mais em velocidade do que em temperatura
por mais que sejam os átomos inquietos
e a espuma quântica danosa aos seres
que dela são feitos e dela nada possam apreender
eu sigo com minha forma de amor
que é um estudo
e que é uma aceitação da matéria
os breves campos
as suaves e discretas montanhas do meu lugar
a paisagem que voa bem do meu lado
vislumbrada pela janela do automóvel
os olhos da filha que são a coisa mais linda e poderosa de todo este planeta em erro
os trabalhadores presos em seus uniformes
os estudantes tentando decifrar códigos da hipocrisia civilizada
pequenos professores
pequenos agricultores
pequenos cuidadores das ruas
que as mantém sempre limpas
por mais que reclamemos de uma ou outra sujeira
os homens que vigiam e protegem os homens de outros homens
que fazem sua triste presença necessária
com toda a limitação que o sistema os impõem
as nuvens que nos sobrevoam
assustando-nos
maravilhando-nos
encharcando a terra com mais e mais elétrons
: como é que tanto fogo pode sair de dentro da água?
: como pode isso ser tão lindo?
o descaso do universo frente a nós
às vezes é quase uma carícia
nossa possibilidade de liberdade
e de felicidade
tenho visto beleza
em tudo o que existe
visível ou invisível
e se há um homem feliz
a caminhar sobre a terra
este sou eu
mas, claro, este não há.