Ando vadeando entre minhas pernas
Meu caminhar arrastado reescreve
Nas pedras das calçadas, a vida breve
Apagada nas cinzas dos cigarros.


Tenho tossido, sentido dores nas costas
E carrego nas mãos a fotografia
Morta
Da época em que o céu riscava cadentes
E quando ainda soprava
Razão
Por entre as gentes.

Ando pensando em raptar-me
Olvidar família, trabalho, lugar
Desaparecer feito nuvem de verão.


Quero libertar-me desta bagagem
Que vem desde muito me encurvando a espinha
                               Dolorida feito dente malato
Quero escapar deste drama, deste ato

Tornar-me personagem de esquina.

Pois bem o sei, doce menina
Cujo rosto e cheiro não posso antever
Que ainda me aguardas em alguma cidade
                               Mítica filha de Platão
E serás em mim a explicação
Do que não se explica nem há razão.