REFÉM DAS PRÓPRIAS ESTREPOLIAS
Olhos de ilha, mamas de sisal
na boca um gosto surrado de outono,
na voz tantas pegadas que perdi a conta.
Parecia se refletir nas encostas da alma sem pressa,
parecia velejar num pensamento fugido qualquer.
Diga lá seu voto de saudade,
diga lá sua diabrura que pra ninguém contou.
Nesse suor cansado, empastado, amordaçado
fez orvalhar finas réstias de medo,
uma sobre a outra.
Ainda se fazia de refém das próprias estrepolias,
ainda se dizia afoito sem entender o porquê de nada.
Era tempo já sucateado sem tempero nem fuligem,
era tempo já untado das poucas vezes em que sorriu.
Por mais que quisesse de fazer cativo,
por mais que quisesse se fazer alvo,
nada acontecia.
Chamou pela mãe que, atrapalhada na vida, não acudiu.
Chamou pela sua alma que, esquecida num canto qualquer, se calou.
Já era tarde, o estômago pedia sossego, a mão tremia feito sonho remido.
Não sabia mais onde suplicar por afeto, talvez perdão.
Se o corpo ainda fosse capaz de subir até o último degrau,
se suas poças de vergonha ainda preparassem a mesa como antes...
Mas esse ser poeta precisava achar seu algoz,
sua cantoria absurda para fazer tudo girar de novo.
Esse ser poeta, cabisbaixo e um tanto triste, pedia aplausos.
Podiam ser ocos, podiam ser vencidos, podiam ser inimigos,
nada mais importa.
Tudo o que sobrara do seu sangue eram folhas dispersas de uma alegria
que nunca havia se aguado, nunca havia possuído.
Aquele poeta desgarrado ainda faria seu melhor grito,
sua maior constelação de gozos e tonéis de fé.
Chegou o vento que tanto chamara,
chegou o peito para mamar até não querer mais.
Chegou o fim das pastagens indigestas,
e dos desafinados socos da vida.
Agora era tempo de sorrir até Deus dizer chega.