Fragmentos

Enquanto dormes dedilho as cordas do teu sonho

ressoando junto ao que em mim falta de ti,

junto à espera e às mãos em silêncio

cúmplices anônimas das florações

que dão cores ao dia,

dão perfume à flor que brota nos jardins desta vida compassada

e voz ao canto alegre das crianças

Dão ao dia vislumbres de eternidade

e recriam a aurora consoante a face de ébano da madrugada,

e a ternura imanente ao gesto intangível

que transforma o teu nome

na ilusão indelével e ausente que ficou

meigamente enternecida no pouco que sei de mim

Foi tanto medo

e um inverno de cores densas

O amor que suplicava à noite que não se fosse

e suavemente sentia o sopro da brisa da manhã bruxuleando a luz das estrelas

Teu nome que a brisa sussurrava entre as acácias e os instantes tímidos do dia

E que os meus lábios espreitavam

sem se atreverem a dize-lo

posto que tudo foi fantasia

Fantasia o que não teve fim,

fantasia o que sempre foi noite

resvalando das inconsúteis lembranças que se derramaram de jarros antigos,

entre verdades e mentiras

e tantos véus turvando a visão e esboroando sonhos

Amanhece, e as boninas ousam ser

mais amarelas e vermelhas

do que o sol que se alça de chama em chama

aos teus suspiros, somente

A noite desperta cansada de ser escura, e se esconde,

enquanto a luz da manhã flutua

inocente em teus cabelos

e brinca travessa com a eternidade fugaz da manhã azul,

efêmera e diáfana

Bela, quando ao passar lá fora faz caminhar as sombras

e girar os girassóis

Amanhece,

e o dia vai deslindando-se pouco a pouquinho

Intemente, rabisca o crepúsculo

sangrando o sol,

avermelhando o mar,

rolando os seixos,

suspirando alcovas,

arrastando folhas magoadas pelo ar,

enquanto o orvalho soluça deslizando nas folhas geladas e quietas

e a vida espera em silêncio um linimento para o "nonsense" da existência,

O poeta, com sua alma ébria e antiga,

escreve verdades e mentiras e cata cacos e fragmentos de solidão,

pespega estórias banais

e se reconhece

nas merencórias e mal traçadas linhas

de extraviadas e esquecidas cartas de amor,

naquilo que o amor, redivivo, chamou de sonho,

naquilo que a vida, diletantemente, chamou de dor