Sentimentos insontes

Entre a letra e o amor

Entre o amor e o ato

Entre a pele e o tato

Entre o ritmo e a rima

Ficou tanto sentimento

no carinho e no sonho que não acorda,

no segredo que não se esconde,

mas se sente neste gosto de ternura

que não se acaba

e mais se apura

Ficou em um nome da infância

Ficou nos intervalos de um tempo,

beijos inquietos,

revolvendo a memória, amiúde

Ficou nos momentos e tardes...

a música tocando num rádio

esperando os meus lábios dizerem poesias aos teus,

esperando que as nossas mãos escrevam os poemas

aos quais um grande amor não baste

E tudo em ti foi carícia

e todos teus foram os meus instantes

Foi tua a música tocando no rádio

num tempo em que amar era o silêncio dos dedos

deslizando nas tuas costas,

era o gesto de abrir as manhãs (tímidas),

como são as manhãs ao despertar

Ficou do amor esta sensação inexprimível

de uma atemporal eternidade

Ficou do (no) amor teus olhos negros

como a canção das noites,

como o verso espontâneo das noites

entrelaçado aos teus braços

Alguém poderá dizer: De tanto amor ficou tão pouco!

Pode ser...

Pode ser que seja pouco

Mas este pouco é tudo e é tanto que continua existindo

"Não basta um grande amor para fazer poemas,"

nem basta um grande amor para dizer segredos e saudades,

para ouvir a pausa e o silêncio dos corpos insontes,

mas basta um pequeno poema feito para um amor

que se enrodilha no nosso colo

para que o tempo viva para sempre

e me procure

num mundo de faz de conta

onde teu cheiro e teu gosto

misto de suor saliva e chiclete

espalham nas noites estes momentos

enquanto o tempo passava lento distante

sem dizer palavra ou verso

sem buscar a rima negra que teus olhos pedem

para que eu fizesse um poema, sujo que fosse,

poema que mesmo diante de tão grande amor

eu não sei fazer

No céu as nuvens caminham nos ventos,

nuas de águas e inúteis tempos,

propondo enigmas,

elucubrando ilusões

do que a vida foi sem ter sido