Palavras

A palavra derrama cores nas flores,

Embaraça-se às borboletas, e voa,

E trina com os pássaros acordando

O silêncio

Para, só então, apascentar a manhã

A palavra despe o rei

Põe a pedra no caminho

Põe os dedos sobre os lábios

E diz silêncios

Eu nada dizia

A cabeça encostada ao peito,

Os olhos postos no chão

Não veem a vida em volta

Escutam o coração

À espera da palavra

Esquecida, escondida, reticente

Maturando entre os sonhos carregados de ilusão

Úmida de sereno que o sol da manhã transforma em orvalho

E brotos pejados de poesia

O vento vem, vermelho e viandante, rodando redemoinhos

O vento passa soprando sem pressa

Desenhando arabescos com a poeira que sobe do chão

Propondo sortilégios de toda sorte

Deslindando algaravias

Rimando vida com morte

O vento passa sem pressa por entre os cacos do dia

Desprendendo o fruto maduro que o sentimento amadureceu

O vento passa cobrindo a semente que cai no chão

Que se dirá, ventura ou desdita

Conforme venha a ser objeto da fala ou da escrita

Um grito na noite ou a trêmula miragem no dia

Não importa!!!

A palavra amadurece ao vento ou ao sentimento que a mereça

E brinca entre os meus lábios

Antes que eu possa supor o sussurrado poema sem fim

Que perora em minha cabeça

E faz cócegas e morde dentro de mim

Olorosa dentro de mim

A palavra recendendo a lírio e a benjoim

Tão linda quanto a manhã surgindo vermelho-amarelada por trás dos morros

É a palavra surgindo de trás dos véus, abrindo baús, para libar sensações

Em plena floração de inverno

Apenas a palavra é mais bela do que a brisa de agosto

Apenas a palavra é fruta de tanto sumo e gosto

A palavra anima a prece ligando a terra ao céu

O corpo à alma

O menino choroso ao adulto estupefato com a vida

A palavra é iluminuras gravadas em ouro e prata na solidão do papel

Ou na escuridão e na neblina da noite em que sonhei com você