Á PORTA DO ATELIER

I

O CAVALETE ESPERA, A TELA ESTÁ AQUI PRONTA;

PODES PRINCIPIAR: VAMOS! TOMA O PINCEL.

QUANTO AOS MODELO BUSCA E OS ACHARÁS SEM CONTA,

MUITOS DOS QUE NÃO TEVE O PRÓPRIO RAFAEL.

PORÉM OLHA! QUE A MUSA AUDAZ NÃO FIQUE TONTA,

METENDO O CORAÇÃO NAS TINTAS DO PAINEL;

NEM SACRIFIQUE AO ORGULHO O QUE A VERDADE APONTA,

EMBORA O ORIGINAL LHE CHAME APÓS CRUEL.

OBSERVA E PINTA; E A LUZ D'EXÓTICA CELAGEM,

DÁ FALA AOS TEUS PERFIS, COMO SE UM GÊNIO FORAS,

RASGANDO LOGO OS VÉUS SE ALGUNS HOUVER QUE OS TRAJEM,

MAS ALI VEIO UM BUSTO IDEAL QUE ME EXTASIA!

BASTA!... VOU BOSQUEJÁ... ENTRAI, MINHA SENHORA:

PODEIS VIR VISITAR A GALERIAS.

II

MUITO HÁ QUE CRITICAR, EU SEI; MAS VOS PROMETO,

QUER SEJA A BOCA ASSIM, QUER ASSADO O NARIZ,

JURO-O SOBRE A CABEÇA AZUL DESTE SONETO

QUE HAVEIS DE BATIZAR QUALQUER DOS MEUS FERIS.

FEITO EM LOUÇA, MARFIM, NÁCAR OU CETIM PRETO,

A ÓLEO, A SÉPIA A AQUARELA, A PENA E ATÉ A GIZ,

PRETENDO EMOLDURAR, DEPOIS, ESBOCETO

NUM GRACIOSO OVAL DE QUATORZE RUBIS

PARA ENVIÁ-LO...

E PORQUE SORRIU TÃO FINAMENTE,

LEITORA, ESTA QUE AI, POR CIMA DE SEU OMBRO,

IRÔNICA ME LÊ?... CAUTELA! È IMPRUDENTE,

SENHORA! PROVOCAR QUEM VAI TER A HONRA E O GOSTO

DE RETRATÁ-LA JÁ, COM TODO O DESASSOMBRO,

POR MAIS QUE NO SEU LEQUE ASSIM ME OCULTE O ROSTO...

1894.